Biodiversidade Biotecnologias Biossegurança

Este Blog foi originalmente criado para os eventos da COP-8 e MOP-3 realizados em março de 2005/Curitiba. Devido à importância de tais temas para a humanidade, a Revista Consciência.net continuará repassando informações relacionadas, incluindo comentários e matérias pertinentes. Boa leitura! Editores responsáveis: Clarissa Taguchi, Paula Batista e Gustavo Barreto. Da revista Consciência.Net - www.consciencia.net

quarta-feira, maio 03, 2006

Brasil terá depósito de patentes de biotecnologia

Resultado de convênio entre o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) e o Instituto Nacional de Metrologia (Inmetro)

Josette Goulart escreve para “Valor Econômico”:

O Centro Nacional de Material Biológico que será usado para o depósito de material vivo de patentes biotecnológicas brasileiras começa a sair do papel.

O Inpi oficializou convênio com o Inmetro, no início de abril, para a realização do projeto e parceria está avançada.

Três biólogos já trabalham integralmente no projeto, outros três serão contratados por meio do concurso recém realizado pelo INPI e o orçamento de R$ 2 milhões para construção da primeira parte do prédio que abrigará o centro está aprovado.

Até mesmo endereço o centro já possui: o campus do Inmetro em Xerém, bairro de Duque de Caxias, no RJ.

Hoje, para se obter uma patente de biotecnologia, as empresas brasileiras precisam enviar o material biológico para EUA e Europa e isso inclui o custo de envio – uma taxa média de US$ 2.500,00 para cada material depositado nestes centros – e toda a burocracia de transporte de um material biológico que, em alguns casos, como podem afetar ou o meio-ambiente ou o ser humano, precisam de autorizações de entrada nos EUA que podem levar meses para serem concedidas.

A consultora Ana Muller, do escritório Castro, Barros, Sobral e Gomes, explica que esse procedimento é necessário em uma patente de biotecnologia porque não há como descrever adequadamente em papel, quando se requisita a patente, a ação de bactérias, por exemplo.

Por isso, é necessário manter o material disponível para que os técnicos possam analisar se o material vivo descrito realmente é capaz de fazer o que o pedido de patente diz que é.

Isso porque as leis de propriedade industrial exigem, além da inventividade e novidade para a concessão de uma patente, a suficiência descritiva (capacidade de reproduzir o invento somente com sua descrição).

O procedimento adequado para fazer o pedido de uma patente biotecnológica é primeiro o depósito do material em alguma autoridade depositária internacional (IDA, na sigla em inglês) pois o número de acesso e a data de depósito precisam estar na patente para garantir de que o material vivo foi certificado pelas depositárias.

Estes centros mundiais são reconhecidos pelo Tratado de Budapeste, que prevê que basta apenas um depósito de material vivo em uma IDA para pedidos desta patente em diferentes países.

O Brasil hoje não é signatário deste tratado e, mesmo assim, aceita que o material seja depositado em uma IDA.

Mas com o centro nacional em funcionamento isso mudará e, segundo o vice-presidente do Inpi, Jorge Ávila, a tendência é que se exija o depósito do material no Brasil para conceder a patente no país.

Isso trará alguma resistência ao projeto. A engenheira química Maria Thereza Wolff, do escritório Dannemann Siemsen, diz que o custo aumentará para as empresas que possuem patentes no exterior, por exemplo, e que fazem o pedido aqui.

Isso porque o material biológico já estará em uma IDA e terá que vir também para o Brasil. Neste caso, outra resistência se impõe.

Segundo ela, nas discussões sobre esse centro realizadas há oito anos, até mesmo o Ministério da Fazenda impunha condições, pois entendia que o material deveria ser revistado para evitar a entrada de drogas no país.

Mas o material biológico precisa ser mantido em determinadas condições para que não estrague e, portanto, não poderia ser examinado na alfândega.

Ávila diz que esses pontos terão que ser resolvidos aos poucos. Assim que o centro nacional estiver funcionando, por exemplo, automaticamente entrará na pauta de discussão se o Brasil deve aderir ao Tratado de Budapeste.

Além disso, o objetivo é fazer com que o centro brasileiro seja tão capacitado quanto as IDAs e que passe a ser também um centro autorizado.
(Valor Econômico, 2/5)

terça-feira, maio 02, 2006

Biocombustíveis: manobra ou vontade política?

Recentemente o presidente Lula transcreveu o slogan "O Petróleo é Nosso" da era Vargas para "O Biodiesel é Nosso", acrescentando que o óleo das sementes deverá constituir cerca de 10% da fórmula do diesel comum consumido por ônibus e caminhões até o fim da década. Um pouco antes, o governo do Estado do Rio de Janeiro apresentou o primeiro ônibus comercial do país movido a biodiesel, a iniciativa é parte da estrutura a ser montada para os jogos Panamericanos de 2007, o RioBiodiesel, e conta com a participação da Coppe/UFRJ e da Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia. Ambas as propostas representam um consenso mundial em tornar as políticas públicas ambientalmente mais sustentáveis. Mas até onde vai a vontade política?

Para moradores de outras cidades como Curitiba, Ribeirão Preto e diversas outras pelo mundo, o biodiesel comercial não é novidade. Os motores movidos a óleos vegetais são tão antigos quanto os movidos a combustíveis fósseis, o inventor Rudolf Diesel já utilizava óleo de amendoim para rodar seus motores em 1897. O álcool também é um biocombustível, e o programa Pró-alcool foi reconhecido mundialmente e, apesar dos impasses, é considerado um sucesso ao possibilitar uma fonte energética viável em substituição ao Petróleo.

Cem anos movidos a petróleo
São apenas 109 anos desde a invenção de Diesel, um século, que podemos chamar de Era do Petróleo. O ouro negro que brota da terra tem origem na decomposição de organismos que habitavam o planeta há milhões de anos, uma combinação de moléculas de carbono e hidrogênio de onde retiramos os componentes fósseis para a produção de óleo, gás, lubrificantes, plásticos, fertilizantes, medicamentos, tintas, tecidos, corantes, conservantes, inseticidas, armas químicas, explosivos, etc. Tais produtos também podem ser produzidos de maneira mais ecológica a partir da alcoolquímica e da oleoquímica vegetal.

Pensando bem são 109 anos, nos quais a humanidade travou duas guerras mundiais, milhares de conflitos e inúmeras ditaduras ao custo de milhões de vidas humanas que foram tragicamente interrompidas. Nesses 109 anos retiramos a autonomia dos povos e concentramos a riqueza, hoje 10% dos mais ricos detém 54% da riqueza do restante do planeta. Países como a Nigéria, grande exportadora de petróleo, gás e carvão tem um dos maiores índices de pobreza, cerca de 70% da sua população vive com menos de 1 dólar Norte Americano ao dia.

Não pense que há cem anos éramos todos pobres e países com índices tão altos de desigualdade foram simplesmente incompetentes em sua administração, não pense que há cem anos morávamos em casas de sapê e não tínhamos acesso a canais de esgoto e que o progresso é um processo democrático no qual cada país tem o seu tempo. A situação não é diferente para grande parte da população mundial e ironicamente, são os países com recursos naturais de interesse e posição geográfica estratégica que mais sofrem com a desigualdade e seus conseqüentes problemas.

A história da humanidade é cheia de casos paradoxos e suas perplexidades, o biocombustível é um dos maiores exemplos do que poderíamos ter sido e não fomos: uma outra sociedade.

Como?
Imagine, há cem anos, se Rudolf Diesel não tivesse desaparecido (ou assassinado?) em 1913 em meio ao oceano a caminho da Inglaterra. Entre 1911 e 1912, o inventor do motor a óleo, postumamente nomeado motor Diesel, predisse "o motor Diesel pode ser abastecido por óleos vegetais e ajudará consideravelmente no desenvolvimento da agricultura dos países que o utilizarem ", acrescentando que "o uso de óleos vegetais como combustíveis de motores hoje parece insignificante. Mas tais óleos podem ao longo do tempo se tornar tão importantes quanto o petróleo e o carvão são no presente momento ".

O mundo de 1900 não é o mesmo de 2000, nunca fomos tão dependentes das fontes energéticas como somos atualmente, o uso anual de energia no mundo gira em torno de 10,345 bilhões de toneladas de petróleo, sendo 1,827 bilhão destinados ao transporte, 3,764 bilhão à geração de eletricidade, 2,236 bilhão à indústria e 2,516 bilhão ao comércio e uso residencial (dados do O Globo de 5/02/2006).

Então continuemos, imagine um mundo onde as máquinas não rodassem através da energia proveniente de combustíveis fósseis, um mundo movido à energia solar captada pelos vegetais, num processo regido pelas Leis da Biotermodinâmica desde a invenção da vida. Neste caso, não se trata de imitar as plantas captando energia solar via fotoreceptores, o trabalho realizado com perfeição pelos vegetais ainda não foi tão bem copiado por nós humanos e nem acreditamos que um dia o seja.

Parte da capacidade energética dos vegetais pode ser traduzida por suas sementes. Como sabemos, as sementes contém reservas de energias para a criação de uma nova planta, tal reserva concentra-se quando retiramos seus óleos e isso sabemos comprovadamente desde que passamos a comê-las.

O tempo não volta
O Sr. Diesel é considerado um dos grandes gênios da humanidade, seu motor foi crucial para o desenvolvimento tecnológico de nossa sociedade, mas sua inocência não foi capaz de prever nosso perverso percurso tecnológico. O petróleo, apesar de ser um recurso finito, não está condicionado a fatores climáticos, disponibilidade de sementes, tempo de colheita e outras situações que impedem a produção de óleos vegetais na proporção que extraímos petróleo. Teriam as sementes condições de suprir a demanda energética que criamos?

A energia proveniente dos óleos vegetais representaria na época a continuação da autonomia nos campos - naquele tempo a população não concentrava-se em cidades - pois Diesel desenvolveu seu motor de maneira a dar autonomia energética a pequenos empreendedores e camponeses. Bastava-se que estes produzissem sementes e obtivessem seu óleo, a tecnologia de extração de óleo não é das mais complicadas nem necessita de tantos aditivos como ocorre hoje.

Quem paga e quem recebe
A concentração de capital promovida pelas leis humanas com relação ao petróleo permitiu que as tecnologias de hoje fossem utilizadas em favor de grupos e não da humanidade. A proposta de obter energia através dos biocombustíveis não é a mesma que a de cem anos, o motivo maior de tal transferência é provocada pelo efeito estufa que está rapidamente modificando o clima do planeta. A limitada capacidade de extração não demonstra ser a maior preocupação, visto que o consumo já é maior que sua prospecção. No presente momento vivemos uma guerra que engloba indiretamente a todos, pois o preço do barril de petróleo influencia qualquer economia, e apenas algumas famílias ligadas à indústria petrolífera é que jogam as cartas.

Indígenas e camponeses são hoje o alvo de maior repressão das forças de dominação provenientes de governos junto a instituições privadas. Em 2003 a FAO constatou que 97% das sementes de trigo plantadas pelos iraquianos eram de replantio ou adquiridas em mercados locais, no ano seguinte o governo Norte Americano impediu que agricultores iraquianos replantassem suas próprias sementes numa conhecida estratégia de guerra de transformar economias autônomas em dependentes. Hoje a quase totalidade das empresas sementeiras no mundo pertencem ao capital de empresas ligadas ao petróleo e às 'tecnologias da vida' – como se autodenominam as empresas de sementes transgênicas e medicamentos.

No 'Especial-Colombia en busca de paz' da Agencia de Notícias Agital, reporta-se a situação de guerra do 7o país em reservas de petróleo. O envolvimento de governos e empresas vai de encontro a movimentos sociais como sindicatos e grupos guerrilheiros explodindo num conflito armado em plena selva Amazônica que data do começo do século passado.

Gado, seres humanos e motores
No Brasil grande parte da destruição de ecossistemas tão importantes como a Amazônia e Cerrado não é causada pelo petróleo mas pelas monoculturas da agroindústria. Numa perspectiva macabra, sementes alimentam gado, seres humanos e motores. O sonho de Diesel que talvez possa ocorrer num futuro próximo não acontecerá como suas previsões, as tecnologias atuais são exclusivas.

Organizações ligadas à movimentos sociais e ambientais tentam de todas as maneiras impedir o uso das sementes Terminator no mesmo momento em que começamos a difundir os biocombustíveis a partir das sementes e plantações de eucalipto. Num curto período de tempo poderemos ver a fusão destas duas grandes forças?

Já numa perspectiva mais segura e avessa ao que a história tem demonstrado, temos o exemplo da Petrobrás que assinou um contrato com quatro empresas fornecedoras de biodiesel para beneficiar cerca de 65 mil famílias de agricultores familiares que plantarão mamona, dendê e soja. As empresas são Agropalma, Brasil Biodiesel, Soyminas e Granol e receberão um selo do Ministério de Desenvolvimento Agrário denominado 'Combustível Social'. Segundo o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, o programa vai ajudar a manter os pequenos produtores no campo: " O programa se apresenta como uma forma de consolidação do homem no campo. Cada agricultor familiar pode dizer que em sua pequena roça de mamona, de dendê, tem o equivalente a um pequeno poço de petróleo ".

E novamente encontramo-nos numa encruzilhada. Apesar das tentativas de promover o desenvolvimento sustentável, hoje, mais do que nunca a única maneira de continuarmos nossa petróleo-dependente sociedade em progresso, precisamos rever nosso percurso. A ciência como parceira do desenvolvimento da humanidade, e não apenas do capital investidor ausente de suas responsabilidades, é a discussão que deverá levar a continuidade das gerações futuras. Essa foi uma das pautas mais importantes da ECO 92 no encontro do Rio de Janeiro e que ainda deixou na COP 2006 suas impressões. Políticas públicas ou privadas devem conter seu compromisso com o futuro e não serem utilizadas como maquiagem verde*

*Termo que se refere ao inglês 'Green Wash' quando empresas e instituições promovem políticas ambientalmente sadias de um lado enquanto por outro permanecem com as mesmas políticas de apropriação e degradação de Recursos Naturais.



Abaixo entrevista com o engenheiro mecânico Thomas Fendel, que nos possibilita o melhor entendimento do funcionamento dos biocombustíveis, além de um panorama da situação energética dos veículos brasileiros. Seguidor de Beautista Vidal, Fendel defende firmemente o uso de óleos vegetais como fonte energética substituta ao petróleo, lembrando que "óleo vegetal existe a 600 milhões de anos e petróleo só a 500":


1) Sr. Thomas Fendel, o proclamado biodiesel propagandeado como a nova fonte energética frente ao petróleo é tão eficaz quanto seu sucessor?
Fendel: Claro que o biodiesel é melhor do que qualquer combustível fóssil, mas existem opções melhores, como o nosso desprezado álcool e o uso direto dos óleos vegetais virgens ou refinados.


2) Você teria dados sobre a eficiência energética deles?
Fendel: Estes números são fáceis de se calcular, e certamente estarão equivocados na sua essência e importância. É exatamente este o motivo do caos relacionado a todas as notícias sobre energia. Sempre se olha e se dá valor para aquilo que não interessa. Por isso, o hidrogênio tem tanta propaganda e tanto investimento, pois simplesmente os especialistas trabalham com números irrelevantes, com dados parciais, sem considerar o todo.

A eficiência e o rendimento podem ser, medidos de várias formas e relativos a várias unidades. Então, por exemplo, podemos comparar o poder calorífico, a quantidade de litros por metro quadrado, as emissões, a octanagem, o preço por km rodado, e infinitos outros fatores, e certamente vários combustíveis serão campeãs em alguma categoria. Por exemplo, queimar hidrogênio não resulta em emissão de CO2. Não resulta na queima propriamente dita, mas resulta na fabricação do H2, que para sua produção utiliza muita energia elétrica, que no mundo provém em 80% de sujas termoelétricas fósseis e nucleares. Mas para se ter uma idéia quantitativa, em termos de R$ por km rodado, acredito que nunca nenhum outro combustível poderá ser tão eficiente como os óleos vegetais, sem falar do efeito refrigerador, em que os respectivos vegetais comem muito mais CO2 da atmosfera do que o CO2 liberado pelos canos de escapamento dos correspondentes motores a bioenergia.


3) Se voltássemos no tempo o Sr. acredita que se a tecnologia de Diesel fosse amplamente empregada tal como ele vislumbrou nossa sociedade seria diferente?
Fendel: Com certeza, estaríamos mais perto do paraíso do que do inferno ao qual estamos nos aproximando com velocidade assustadora. Com o uso dos óleos vegetais penso que estaríamos mais racionais, não seríamos tão esbanjadores, daríamos mais valor à vida, ao meio ambiente, que afinal é o que nos alimenta e que possibilita a nossa existência. Nunca o homem será competitivo com a natureza. Nunca ele sequer será capaz de fazer algo parecido como um incômodo pernilongo...


4) O Sr. cita que o biocombustível pode ser composto de óleos vegetais crús, refinados e inclusive o álcool. São processos semelhantes, podem ser feitos em conjunto, utilizados no mesmo veículo?
Fendel: Os óleos vegetais virgens ou refinados custam metade do preço do biodiesel. Produzir biodiesel de óleos vegetais é como fazer biogasolina de álcool. Tem que fazer motores a álcool. Tem que fazer mortores a óleos vegetais. Tal qual os motores à gasolina podem ser adaptados para álcool, os motores a óleo Diesel podem ser adaptados para óleo vegetal.


5) Como o Sr. diz custarem mais barato que o bodiesel?
Fendel: Simples. O biodiesel é um óleo vegetal modificado, trabalhado, oligopolizado. Então sempre, ele vai custar no mínimo o dobro do preço dos óleos vegetais virgens ou refinados.


6) Algumas informações interessantes tem surgido demostrando que em favorecimento à cana-de-açúcar e palma, florestas milenares estão sendo destruídas. O biocombustível pode ser uma alternativa energética sem destruir florestas e transferir os hectares destinados à produção de alimentos para produção de energia?
Fendel: A questão é que as fantásticas florestas estão sendo substituídas por monoculturas. Mas, com a evolução da consciência humana, poderíamos desenvolver as multi ou policulturas. Por exemplo, papel não precisa ser feito só de eucalipto ou só de pinus. Papel pode ser feito de uma salada de biomassas... inclusive o cânhamo, como eram feitos nosso papel e roupas até o começo do século passado. O álcool pode ser produzido da mandioca, da batata, de madeira, de palha de soja, etc. Os EUA este ano irão produzir mais álcool que o Brasil. E lá eles fazem álcool de milho, muito mais caro e menos eficiente, baseado em subsídios agrícolas, que o Brasil muito bem ataca na OMC.

Qualquer vegetal tem sementes e todas as sementes tem óleo vegetal. Portanto, pode-se utilizar uma floresta biodiversa de modo sustentável e eterno. Basta ao homem ser menos estúpido. E plásticos, detergentes e tintas, feitos da mesma forma, de plantas.


7) Álcool e óleo vegetal geram energia da mesma maneira que o petróleo porém sem emissão de gases do efeito estufa?
Fendel: Se a gente for míope e olhar apenas a saída do cano de escape dos motores, vemos que a queima de todos os combustíveis resulta em emissões de gases. E sempre os biocombustíveis geram gases menos nocivos do que os fósseis. Bem, mas temos que analisar o todo. Assim, quando você queima fósseis, você está desenterrando carbono e lançando ao ar, promovendo o efeito estufa.

Já com os biocombustíveis ocorre exatamente o contrário, pois para se fazer álcool e óleo vegetal, tem-se que plantar vegetais. E os vegetais quando crescem, comem CO2 do ar, liberando oxigênio, num fantástico e desprezado processo conhecido como fotossíntese. Então toda a matéria vegetal é proveniente da 'sujeira' do ar. E sempre, quando você queima álcool ou óleo vegetal, você queima apenas parte do vegetal, ou seja a planta come mais CO2 do ar, do que o que você devolve. Além disso, o carbono do farelo da soja tem de ser creditado às vacas, e não à bioenergia. Assim, ocorre o real seqüestro de CO2 pelo uso das bioenergias. Na realidade, utilizando os biocombustíveis estamos promovendo o efeito refrigerador, o contrário do efeito estufa.


8) O Sr. tem uma pequena empresa de transformação de motores à Diesel para óleo vegetal e o Sr. alega que as leis não permitem que os carros rodem com esta forma de combustível, para este tal ônibus do Rio de Janeiro como outros experimentos e usos da indústria automobilistica com motores à Diesel funcionarem foi preciso alguma mudança na legislação ou há alguma brecha para estes casos?
Fendel: Minha empresa produz kits que transformam motores Diesel para óleo vegetal. Quanto ao biodiesel, é um programa inútil e desnecessário. O programa brasileiro por exemplo está iniciando com 2% de biodiesel e 98% de Diesel fóssil, isso é uma piada, uma chacota, pois qualquer motor aceita até 2% de urina de rato (um exemplo) no combustível, sem ratear ou reclamar, e irá emitir menos NOx.

A questão da legislação brasileira é igualmente estúpida. Somos o único país do mundo no qual é proibido ao povo andar com carros a Diesel, mais baratos e mais eficientes, e em conseqüência somos proibidos de andar com carros a óleos vegetais. Disso resulta que não posso andar com meus veículos brasileiros com óleo vegetal, pois não consigo alterar no Denatram o combustível descrito no certificado do veículo, e portanto sou obrigado a andar aqui com um carro emplacado no Paraguai. Seguindo as leis brasileiras, a polícia deveria apreender todos os carros nacionais nos quais está escrito "gasolina" nos documentos, afinal nenhum deles anda com gasolina, pois nos postos só se vende A25 ou seja 25% de álcool na gasolina, o que não é gasolina, e sim uma mistura e por ironia, bem menos poluente.


Mais informações em:
http://www.biodieselecooleo.com.br/biodiesel/motordiesel.htm
http://www.biodieselecooleo.com.br/biodiesel/historia.htm
http://www.doxford-engine.com/diesel.htm
http://rudolf-diesel.brainsip.com/
http://www.autonews.com/files/euroauto/inductees/diesel.htm
http://www.schnews.org.uk/diyguide/howtomakebiodiesel.htm
http://www.wnbiodiesel.com/technology.html
http://www.ambientebrasil.com.br/noticias/index.php3?action=ler&id=22998
http://www.radiobras.gov.br/materia_i_2004.php?materia=253957&editoria=


Para fotos clique aqui.

BIOSSEGURANÇA: Árvore transgênica, a bola da vez

19/04/2006
Transnacionais do agronegócio criam estratégias para transformar agricultura e a alimentação em mercadoria

Raquel Casiraghi e Solange Engelmann
de Curitiba (PR)

"Com a possibilidade das árvores transgênicas, o problema da contaminação é ainda mais grave porque o pólen pode viajar de 2.500 a 3.000 quilômetros", alerta a pesquisadora mexicana Silvia Ribeiro, em entrevista exclusiva ao Brasil de Fato. Segundo Silvia, trata-se de uma das maiores agressões das indústrias e do agronegócio contra a alimentação de todo mundo. "Todas as maneiras de resistir estão diretamente relacionadas à organização dos camponeses e à solidariedade de outros movimentos", diz.
As transnacionais querem as árvores transgênicas porque a tecnologia possibilita o uso de grande quantidade de agrotóxicos em áreas de monoculturas, inviável nas convencionais, que são sensíveis aos venenos. Com isso, as empresas podem abalar a biodiversidade e colocar em risco o ecossistema. Silvia também chama a atenção para os efeitos nocivos que os transgênicos exercem sobre a saúde humana. Pesquisas recentes realizadas nos Estados Unidos dão conta de que o alto consumo de soja está causando uma baixa na fertilidade masculina, os homens produzem menos espermatozóides.

Brasil de Fato - Como surgiram os transgênicos?
Silvia Ribeiro - Os transgênicos estão no mercado há dez anos. Os primeiros a cultivarem foram os Estados Unidos, seguidos pela Argentina e Canadá. Durante muito tempo estes três países tinham a maioria dos transgênicos, que estavam no campo. Segundo uma instituição de estatística financiada por empresas, existem 17 países no mundo com plantação comercial de transgênicos. Mas, esses três países ainda representam a maioria, mais de 80%. Juntos com Brasil e China, chegam a 98%. Entre os cultivos comerciais que já estão no campo, quatro estão no mundo inteiro que são: soja (o principal) da Monsanto com 66%, milho, canola e algodão. Além deles, há outros em experimentação: batata, mamão papaia, feijão, mandioca, e isso preocupa porque são cultivos mais próximos das pessoas.

BF - Quais as vantagens dos transgênicos?
Silvia - Nenhuma das promessas das empresas se cumpriram. Elas diziam que os transgênicos são mais nutritivos, bons para saúde, têm melhor qualidade de sabor. Nada disso é verdade. A maioria, mais de ¾ dos transgênicos no mundo, é uma semente resistente a herbicida da própria companhia. Essa, sim, é a realidade. Depois de dez anos fica muito claro que a questão dos transgênicos não tem nada a ver com as necessidades de ninguém, mas com os interesses das empresas. Nos Estados Unidos, que têm mais de 60% dos transgênicos do mundo, as estatísticas já demonstram que aumentou o uso de agrotóxicos.

BF - Por que os agricultores estão plantando transgênicos?
Silvia - Simplesmente porque não têm opção. São três empresas que detêm 100% das sementes transgênicas no mundo. A maioria é da Monsanto, que agora tem 88%; o restante é da Syngenta, DuPont, Basf, Dow e Bayer. Todas as outras empresas estão associadas a estas. As empresas só estão produzindo transgênicos para vender seus próprios agrotóxicos, pois todas são grandes fabricantes de agrotóxicos, antes de produzir sementes. As sementes chegaram depois para se apropriar de um mercado maior e vender os agrotóxicos. Nos Estados Unidos, os transgênicos têm um rendimento menor que os cultivos convencionais. Como só existem essas empresas por lá, são elas que vendem os transgênicos e não transgênicos. Há cinco anos, quando a Europa decretou a moratória contra o milho transgênico, os agricultores dos EUA tentaram voltar para o milho convencional, mas as empresas disseram que não tinha sementes. Eles são obrigados a usar transgênicos porque não tem outra coisa no mercado, isso é uma manipulação muito grande do mercado. Tem um informe do Ministério da Agricultura dos EUA, feito em 2003, onde analisaram os resultados econômicos dos transgênicos no país. Como encontraram somente resultados negativos, o Ministério da Agricultura não entende por que os agricultores continuam usando transgênicos, não há uma explicação direta. A razão porque disseram isso principalmente com a soja, mas também com o milho é que produzem menos e custa mais e, além disso, usam mais agrotóxicos. Em alguns lugares dos EUA se usa ate 30% mais venenos e produz 10% a 15% menos.

BF - Se os transgênicos não rendem financeiramente, por que os agricultores continuam plantando?
Silvia - Porque nos Estados Unidos e Canadá não há opção. E na Argentina os agricultores já estão escravizados com a plantação de soja. Lá a expansão foi tão forte que produziu uma autêntica reforma agrária ao contrário: 40% dos estabelecimentos grandes e pequenos desapareceram no processo de plantio da soja transgênica. Como o investimento para a produção da soja transgênica é maior, os pequenos não resistiram e foram comprados pelos maiores. Isso produziu uma concentração da terra impressionante. E agora, na Argentina a maioria das terras está plantada com soja, e os agricultores não conseguem sair dessa estrutura de dependência. É importante o Brasil analisar o que se passou com a Argentina. No resto do mundo a liberação dos transgênicos tem uma relação direta com a corrupção. Para liberar a comercialização dos transgênicos na Indonésia, a Monsanto subornou 140 funcionários públicos. Tenho certeza de que no México as empresas também pagaram para um monte de gente. Além disso, estão padronizando as leis referentes à biossegurança. É curioso que a lei de biossegurança do Brasil e do México é muito parecida. A do México foi escrita pelas empresas: Syngenta, DuPont e Bayer, juntamente com alguns centros cientistas da Academia Mexicana de Ciência que trabalham para estas empresas.

BF - O mundo consome toda a soja transgênica produzida?
Silvia - Sim, mas isso também é uma campanha. Por exemplo, no Brasil a introdução do trigo transgênico foi forçada pelos EUA para criar uma dupla dependência: de compra dos produtores e para acabar com cultivos locais que davam mais autonomia. No caso da soja é a mesma coisa. Hoje, o produto é encontrado em qualquer supermercado, tem componente de soja em 70% a 80% dos produtos. Além disso, toda a ajuda alimentar no mundo, por causualidade, é de soja e trigo. Também tem muita propaganda dos benefícios da soja. Porém, já tem estudos sobre a soja transgênica que são assustadores. Um deles saiu numa resenha publicada no ano passado no jornal Washington Post, um dos maiores diários dos Estados Unidos. Foram feitos também experimentos voluntários e foi comprovado que como a soja tem muito fitoestrogênio, está causando uma baixa na fertilidade masculina, os homens produzem menos espermatozóides. A pesquisa contatou que isso tem uma relação com o aumento do consumo de soja.

BF - Por que a Argentina está brigando com a Mosanto para não pagar os royalties?
Silvia - Na Argentina os royalties são ilegais, porque o país não permite patente de plantas. Além disso, a soja transgênica não tem patente na Argentina, porque a Monsanto esqueceu de registrar a patente da soja RR. Começaram a vender e acharam que não teriam problema. Depois quando tentaram registrar já era tarde. Outro fator é que na Argentina, os agricultores têm o direito de replantar as sementes nos anos seguintes. Por isso, os agricultores argentinos, mesmo os industriais, não querem pagar nada, porque estão protegidos pela lei, e porque o país não reconhece esta patente.

BF - Quais os países que reconhecem a patente da Monsanto?
Silvia - No Norte, a maioria deles, no Sul são poucos. É por isso que a Monsanto tentou fazer acordos direto com os países. No Brasil estão fazendo acordo com as cooperativas, que cobram os royalties e ficam com uma parte dos recursos. Isso é horrível porque tentam favorecer alguns intermediários para fazer a cobrança.

BF - Então os royalties são um problema para as empresas?
Silvia - Não são apenas um problema para a cobrança. Tem outros países muito mais disciplinados, como México, África do Sul, onde os governos tentam cobrar, mas muitos países não querem pagar. Por isso, que as empresas estão deseperadas pela liberação do terminator. Como o terminator é uma patente biológica, não precisa de nenhum controle, nem lei. Ao comprar, o agricultor já paga royalties, se quer voltar a usar têm que comprar outra vez. Esta é um patente biológica sem data para terminar. O terminator é para controlar a agricultura industrial e a agricultura camponesa. Trata-se da maior tentativa que as empresas já fizeram para controlar as sementes no mundo.

BF - Por quanto tempo a agricultura camponesa pode resistir sem contaminação?
Silvia - Isso depende dos camponeses, dos movimentos e da capacidade de resistência. Por exemplo, no México, o milho foi contaminado por transgênicos. Os camponeses não têm certeza do grau de contaminação, porque os métodos para controlar a contaminação pertencem às empresas, por isso ninguém está 100% seguro. As empresas têm que dar para os agricultores o padrão de soja transgênico que colocaram. No México, por exemplo, os camponeses se organizaram para controlar quais são as sementes que entram e saem da comunidade ou da região. Com a possibilidade das árvores transgênicas, o problema da contaminação é ainda mais grave porque o pólen pode viajar de 2.500 a 3.000 quilômetros. Esta é uma das maiores agressões das indústrias e do agronegócio contra a alimentação de todo mundo. Todas as maneiras de resistir está diretamente relacionada à organização dos camponeses e à solidariedade de outros movimentos.

BF - Podemos perceber que a empresa de sementes também está no setor de agrotóxicos e de medicamentos. Por que existe essa relação?
Silvia - Há 15 anos as companhias químicas acharam que uma maneira para assegurar a dependência dos agricultores seria comprar as empresas de sementes. As químicas são mais antigas, têm muito mais dinheiro, e a maioria já era farmacêutica. Estas empresas querem controlar mercados-chave, de necessidades básicas, como: saúde e alimentação.

BF - A indústria química sintetizou o agrotóxico?
Silvia - A maioria dos agrotóxicos foi desenvolvida como arma. Só depois diminuíram as doses para matar insetos; antes era para matar pessoas. Foi a indústria química que comprou as outras e, em alguns casos, também se transformou em farmacêutica. E todas elas têm origem comum, que é a petroquímica. Então, se formos nas raízes dessas empresas, chegaremos até as petroleiras.

BF - Depois dos transgênicos e do terminator o que vem é a nanotecnologia?
Silvia - A base do transgênico vai para o terminator, inclusive não só para o terminator, mas para o que chamam de tecnologia para controlar as características da planta. A questão da nanotecnoligia tem a ver com a questão lógica do capital na agricultura, que é buscar como fazer mais negócios com menos pessoas, e produzindo produtos novos. A nanotecnoliogia não é só na agricultura, é uma tecnologia para manipular a matéria viva e a não-viva em nível dos átomos e das moléculas. A nanotecnologia é a escala dos átomos e moléculas, porque um nananômetro é uma bilhonésima parte de um metro, um milhão de vezes menor que um mílimetro.

BF - O que isso significa?
Silvia - No caso da agricultura já fi zeram arroz experimental. Arroz atomicamente manipulado, introduziram um átomo de hidrogénio dentro do arroz para mudar a cor. Os Estados Unidos têm um programa muito grande para usar nanotecnologia na agricultura, e eles estão tentando fazer com que isso se espalhe no mundo antes de qualquer regulação. A Embrapa no Brasil já tem vários experimentos. É a nova forma para ir além dos transgênicos e se apropriar do que compõem os genes. Foram das sementes para os genes e dos genes para os átomos. E quanto menor você vai, maior é o poder que tem porque controla os átomos.

BF - Como é a expectativa da nanotecnologia junto às empresas?
Silvia - O problema é que como a nanotecnologia tem tantas diferentes aplicações, fica difícil controlar. Além disso, as 500 maiores empresas do mundo já têm investimentos nessa área.

Quem é
Silvia Ribeiro é pesquisadora do Grupo de Ação sobre Erosão, Tecnologia e Concentração (ETC), no México.