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terça-feira, junho 12, 2007

Novos estudos expõem danos do glifosato

Por Stephen Leahy para o IPS

Estudos científicos somam provas do impacto na saúde humana e animal do herbicida Roundup, usado para eliminar plantações de coca na Colômbia.

TORONTO, 11 de junho (Tierramérica).- A fumigação aérea, financiada pelos Estados Unidos, de plantações colombianas de coca perto da fronteira com o Equador, afetou severamente o DNA da população local, revelaram cientistas da Pontifícia Universidade Católica do Equador, em Quito. Mostras de sangue de 24 equatorianos, que vivem a uma distância de até três quilômetros da fronteira setentrional, apresentaram aberrações de cromossomos entre 600% e 800% superiores aos das pessoas que vivem a 80 quilômetros, afirma o estudo.

Os moradores da fronteira examinados estiveram expostos ao herbicida comum glifosato – que a empresa norte-americana Monsanto patenteou sob o nome de Roundup – pelas aspersões aéreas ordenadas por Bogotá a partir de 2000, como parte do Plano Colômbia antidrogas e contra-insurgente financiado por Washington. Os equatorianos apresentaram imediatamente dores intestinais e vômitos, diarréia, dores de cabeça, tonturas, aturdimento, ardor nos olhos ou na pele, visão embaçada, dificuldade para respirar e brotoeja, diz o estudo, que será publicado na revista científica brasileira Genetics and Molecular Biology, da Sociedade Brasileira de Genética

Porém, o dano encontrado no DNA (ácido desoxirribonuclêico) das pessoas analisadas pode ativar o desenvolvimento de câncer e outras anomalias que provocam aborto espontâneo, segundo o pesquisador César Paz y Miño, diretor de Genética Molecular Humana na Universidade Católica do Equador e principal autor da pesquisa. Em geral, todas as pessoas apresentam algum grau de dano genético por exposição a radiação ultravioleta, poluição do ar ou produtos tóxicos, entre outros fatores. Contudo, dos 24 analisados, nenhum fumava, tomava bebida alcoólica ou remédios não prescritos, nem empregava em seu trabalho herbicidas ou pesticidas que pudessem ter causado o problema observado, disse Paz y Miño ao Terramérica.

A concentração de Roundup, 20 vezes superior ao máximo recomendado pelas normas norte-americanas, pode ser a razão de seu efeito genotóxico (capaz de causar mutação genética) nos indivíduos expostos, acrescentou o cientista. As amostras de sangue foram tomadas pelo médico espanhol Adolfo Maldonado, da não-governamental Ação Ecológica, que desde o início da década estuda problemas sanitários, econômicos e sociais de populações equatorianas afetadas pelas fumigações feitas pela Colômbia.

Desde 2000, Washington financia as fumigações colombianas de coca, matéria-prima da cocaína, da qual a Colômbia é primeiro produtor mundial, e nos últimos três anos gastou mais de US$ 1,3 bilhão no combate ao narcotráfico. No ano passado, a Direção Antinarcóticos da Policia Nacional Colombiana fumigou 171.613 hectares de coca e papoula, segundo o Informe sobre a Estratégia Internacional de Controle de Narcóticos, divulgado em março pelo Departamento de Estado norte-americano.

As aspersões aumentam a cada ano, desde 2000. Em 2006, foram 24% superiores às do ano anterior. Três unidades de fumigação aérea, financiadas e operadas por Washington, trabalham em tempo integral na Colômbia, e uma quarta entrou em operação em 2006, diz o Informe. A aspersão “segue rígidas medidas ambientais, controladas por várias agências do governo da Colômbia”, afirma. Quanto a problemas sanitários, “o Instituto Nacional Colombiano de Saúde não verificou um único caso de efeitos adversos para a saúde humana vinculados à fumigação com glifosato”, assegura.

Paz y Miño refuta essa afirmação. Além de seu estudo, pesquisas da Universidade de Los Andes e da Universidade Nacional da Colômbia “dão conta de dano causado pelas fumigações aéreas nos colombianos”, afirmou. Desde 1994, vários estudos mostram impactos do Roundup nas pessoas e na natureza, acrescentou o cientista. O Roundup é uma mistura de glifosato e outros produtos que aumentam a penetração do herbicida ou estimulam seus efeitos tóxicos. Somente o glifosato – ingrediente ativo – foi completamente testado pelas autoridades norte-americanas quanto aos seus impactos sanitários e ambientais.

Em 2005, cientistas franceses, liderados por Gilles-Eric Seralin, afirmaram que algumas horas de exposição ao Roundup, a uma concentração dez vezes menor do que a encontrada no uso agrícola, eram tóxicas para células da placenta humana. Em maio, Seralin informou sobre novas descobertas, segundo as quais, mesmo diluído até dez mil vezes, o Roundup alterava a produção hormonal das células placentárias. “Este trabalho pode ajudar a compreender melhor os abortos espontâneos, nascimentos prematuros e malformações sexuais em recém-nascidos”, disse Seralin em um comunicado.

Em abril deste ano, danos no DNA foram documentados por cientistas turcos da Universidade de Mersin. Mesmo em concentrações de cinco a 15 partes por milhão, o Roundup afetou o material genético dos peixes, afirmaram. “Não há dúvidas de que as fumigações estão matando os anfíbios na Colômbia”, disse Rick Relyea, biólogo da Universidade de Pittsburgh, dos Estados Unidos. Em 2005, Relyea documentou que o Roundup era letal para as rãs. Mais de 90% dos girinos morreram após serem expostos a pequenas doses de polioxietil amina (POEA), parte da fórmula do Roundup que ajuda o glifosato a penetrar nas folhas das plantas.

Experiências com rãs norte-americanas mostraram que “mais de 80% dos adultos expostos ao Roundup em proporções normais morreram em um dia”. Não há dados sobre os impactos da fumigação em anfíbios colombianos. Essas descobertas levaram o congresso dos Estados Unidos a exigir, em 2006, garantias de que os mangues colombianos não seriam fumigados, disse Relyea ao Terramérica. Entretanto, a maioria das rãs vive em pequenos pântanos que não são facilmente detectáveis do ar, e muitas espécies se encontram em árvores e pastagens, acrescentou.

Como o Roundup é o herbicida mais usado no mundo, pode ser um fator que explique a drástica diminuição das populações de rãs, mas não há provas concludentes, afirmou Relyea. Por outro lado, são claras as evidências do efeito das fumigações na fronteira equatoriana, assegurou Paz y Miño. Foram documentados destruição de cultivos legais, morte de gado, animais domésticos e peixes, além dos impactos na saúde humana. Seu grupo de pesquisas está terminando uma nova série de estudos sobre os efeitos do glifosato, apenas com o POEA, em insetos e células humanas cultivadas in vitro. “Posso adiantar que estamos encontrando dano genético”, afirmou.

* O autor é correspondente da IPS.