Biossegurança, uma participação de todos
Curitiba, 14 de março de 2006. Iniciaram ontem, as discussões relativas ao MOP-3 que trata sobre a Biossegurança, o Protocolo de Cartagena. Um dos temas mais polêmicos, como também um dos mais importantes assuntos a ser discutido durante as atividades da Conferência sobre Biodiversidade que acontece na semana que vem. Empresários, ambientalistas, membros e ativistas das mais diversas áreas sociais de todo o mundo estão presenciando o encontro que deverá definir qual será o impacto na economia, na saúde e no meio ambiente, para os próximos anos em relação aos Organismos Vivos Modificados (OVMs).
A discussão de hoje e dos próximos dias é sobre a questão da manutenção da expressão "pode conter transgênico" na rotulagem das cargas de OVMs, os comumente chamados "transgênicos", exportadas de um país para outro. O Protocolo de Cartagena trata da transferência, manejo e uso seguro de transgênicos, e por isso discutem temas relativos à identificação, embalagem, manuseio, responsabilidade e reparação de danos resultantes do movimento transfronteiriço desses produtos.
Marcelo Furtado, coordenador de campanhas do Greenpeace, esteve em Curitiba em fevereiro e, na ocasião, colocou que principalmente as organizações ambientais, estão preocupadas com as questões estratégicas da Biodiversidade e Biossegurança, e também com a posição indefinida do governo brasileiro que vem cedendo às pressões do comércio internacional.
No fim da tarde de hoje (14/03), a Agência de Notícias do Planalto , divulgou que o governo brasileiro decidiu defender a rotulagem explícita de cargas de alimentos que contenham organismos geneticamente modificados. A tão discutida questão fica assim: ao invés de ‘pode conter’, fica ‘contém’ OVMs.
Para as organizações civis que trabalham com a agricultura familiar, a "expressão contém será utilizada nos casos onde exista identificação no sistema de produção" é coerente com a legislação brasileira de rotulagem, que já obriga a identificação em todas as cadeias que utilizam transgênicos, como, por exemplo, a da soja. Mas o prazo de 4 anos, sugerido pelo Brasil, para que os países implementem o sistema de identificação na produção de transgênicos pode ser usado para protelar a implementação do Protocolo. Segundo as organizações, a identificação de transgênicos já vem sendo feita, tanto para a cobrança de royalties como para atender às demandas dos mercadores.
A posição de governos partes do Protocolo
O governador do Estado do Paraná, Roberto Requião, destacou as iniciativas ambientais do Paraná, entre elas a política firmada contra os organismos geneticamente modificados, especialmente a soja, e declarou que "as preocupações sobre a segurança na biotecnologia; as janelas do mercado das sementes tradicionais e a necessidade de eliminar a 'escravidão da produção' das corporações transnacionais detentoras das patentes das sementes geneticamente modificadas", declarou.
A malanesa Fatimah Raya Nasron, presidente da MOP3, declarou que ficou entusiasmada com a oportunidade de que se resolvam as questões pendentes aos adotar os requerimentos detalhados da documentação dos OVMs (organismos vivos modificados) para alimentação, forragem e processamento.
"É preciso oferecer mais condições para que os países em vias de desenvolvimento possam completar seus marcos de trabalho nacionais sobre a segurança da biotecnologia", afirmou.
O representante do Ministério do Meio Ambiente, Cláudio Langone, disse que os governos são responsáveis pela regulação da biotecnologia, porém afirmou que eles também necessitam da cooperação de outros atores, entre eles os cientistas, cidadãos e organizações não-governamentais. "O Brasil incorporou em sua história de trabalho legal, vários princípios ambientais internacionais, entre eles se incluem o princípio preucatório".
O ‘Princípio da Precação’ prevê que o ônus da prova fique a cargo do agente poluidor em potencial, para que assim ele demonstre se uma substância ou atividade causará danos ambientais, ou não, ao invés da responsabilidade cair sobre a sociedade que deverá provar tal dano.
Ahmed Djoghlaf, secretário executivo da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) lembrou a história do Protocolo de Cartagena e convidou os delegados para promoverem uma nova aliança estratégica entre os governos, a sociedade civil, as mulheres, as autoridades locais, as populações indígenas, a comunidade científica e o setor privado para assegurar a continuidade e a efetividade do Protocolo.
Na Plenária de Abertura também estavam presentes Elisabeth Mrema, representando o diretor executivo do PNUMA, que referendou o trabalho da entidade em fortalecer a capacitação dos países em vias de desenvolvimento e os países com economias em transição. "A criação de capacidades impulsionada pelos países é um requisito crucial para assegurar a implementação do Procolo".
Pela União Européia, Bulgária, România, Croácia, Macedônia, Albânia, Bósnia e Herzegovina, Servia e Montenegro, esteve presente um representante da Áustria, que pediu uma decisão a respeito do Artigo 18.2(a) e destacou a importância do Mecanismo de Intercâmbio sobre a Segurança da Biotecnologia, a criação de capacidades, e a evolução e gestão do risco.
A Etiópia, representando a África, frisou que "outro fracasso na hora de conseguir uma decisão sobre esse Artigo, condenaria à morte o Protocolo", e expressou sua confiança na vontade do país anfitrião (Brasil) e dos outros participantes para evitar um fracasso como esse.
Representando a América Latina e o Caribe (GRULAC), Equador, enfatizou que "essa é uma oportunidade de avançar para assegurar a proteção da biodiversidade, o conhecimento tradicional e a necessidade de garantir o uso sustentável com tecnologias ambientalmente amigas". Japão elogiou os méritos do Protocolo, especialmente o "Mecanismo de Facilitação do Intercâmbio sobre a Segurança da Biotecnologia" e pediu que nessa discussão se avancem as discussões e a documentação sobre os OVMs.
A China colocou que a efetividade do Protocolo passa pela ajuda dos países na implementação do documento e, as Filipinas colocaram como prioridade as discussões sobre responsabilidade e compensação, a criação de capacidades e a avaliação do risco.
Mais sobre Cartagena
Nesses mais de dez anos da Convenção sobre Biodiversidade – CDB, o único protocolo firmado entre as Partes é o Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança. Adotado em 2000 só entrou em vigor em setembro de 2002, com o objetivo de proteger a biodiversidade dos riscos apresentados pelos organismos vivos modificados (OVMs), que possuem uma combinação nova de material genético obtido através do uso da biotecnologia moderna.
"O protocolo define os procedimentos para que os países exportadores recebam informações claras sobre a origem do produto para assim, definir a entrada ou não do material em seu país", comenta Rubens Nodari, gerente de recursos genéticos do DCBio, do Ministério do Meio Ambiente.
A bandeira levantada pelo protocolo é a da precaução, pois a falta de comprovações científicas sobre os benefícios e malefícios dos OVMs é a grande preocupação. O termo Biossegurança é utilizado amplamente para descrever os esforços para reduzir e eliminar os riscos potenciais da Biotecnologia e seus produtos.
Essa discussão toda é baseada no Artigo 8 da CDB que estabelece que as Partes "devem estabelecer o manter meios para manejar os riscos associados ao uso e soltura de organismos vivos modificados (OVMs)", e que os países são obrigados a implementar ações em nível nacional para assegurar que eles não causem efeitos adversos sobre a biodiversidade.
Sobre as discussões dos Grupos de Trabalho
Facilitação do Intercâmbio de Informação sobre Segurança da Biotecnologia
Foi apresentado pela Secretaria um documento sobre a operação e as atividades do Mecanismo de Facilitação do Intercâmbio de Informação sobre a Segurança da Biotecnologia redigido em conjunto pela UNEP/CDB/BS/Cop-MOP3/3. Muitas partes apoiaram a revisão desse Mecanismo. Já o Brasil pediu que se identifiquem os inconvenientes que enfrentam os países em desenvolvimento.
Nigéria, representando a África, destacou as limitações em infraestrutura, recolhimento de dados e recursos humanos, e a China e a Índia pediram ajuda para a criação de um Fundo para o Meio Ambiente Mundial (FMAM). Os delegados debateram a necessidade que se traduza a informação do Mecanismo para outras línguas.
Nesse grupo também se discutiu a Manipulação, transporte, envasamento e identificação, referentes também ao Artigo 18.2(a). O presidente desse grupo de trabalho, lembrou do acordo sobre o detalhamento dos requerimentos para a documentação dos OVMs, dentro do limite de dois anos, conforme definidos na MOP/2.
O auge da discussão foi a Rede de Trabalho do Terceiro Mundo, representando as ONGs, que se manifestou que um acordo desse tipo era necessário há muito tempo. A Secretaria de CODEX descreveu suas atividades com relação à rotulagem de organismos geneticamente modificados, a análise e amostragem e a presença acidental de OVMs. Ficou estabelecido um grupo de contato, co-presidido por François Pythoud (Suíça) e Luiz Alberto Figueiredo Machado (Brasil).
Criação de capacidades
Hartmut Meyer (Alemanha) falou sobre a segunda reunião de coordenação para governos e organizações que implementam ou financiam atividades de criação sobre a segurança da biotecnologia. Naníbia e Malásia apoiaram o projeto de um plano de ação atualizado e, a Noruega, pediu que se passe da planificação para a implementação. Sobre a Vigilância e apresentação de informes a Noruega apoiou que se peça às Partes que enviem seu informe nacional regular aos menos 12 meses antes da MOP/4.
Com relação à Avaliação e Revisão, África e Cuba apoiaram o projeto de decisão. Brasil, Canadá e União Européia propuseram uma "revisão leve" e Japão e Egito, sugeriram que a Secretaria compile o material enviado pelas Partes sobre as avaliações de efetividade para a MOP/4.
Estas foram as primeiras iniciativas, a apresentação de casos, resta agora esperar as votações. Os transgênicos são assunto tão debatido pois não se trata apenas da ciência pela ciência, de contaminação genética ou criação de novas espécies; trata da ciência com fins econômicos. A produção e comercialização de alimentos e medicamentos transgênicos, é um mercado globalizado e do tamanho deste planeta. Por isso concernem a todos. Então devemos mostrar aos nossos representantes nossa presença e vontade, mesmo que as discussões não sejam abertas. O que tem urgência não deve ser ignorado, e depois de votadas, não devemos aceitar decisões que não desejamos, a participação é assim.
Consciência.Net
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